No início de 2020, a multinacional japonesa Honda comunicou a primeira morte oficial registrada no Brasil devido à falha de projeto dos airbags da fornecedora japonesa Takata, conhecidos como “airbags mortais”.
O problema afetou mais de 100 milhões de veículos globalmente, produzidos entre o fim dos anos 90 e meados da década de 2010 e desencadeou a maior série de recalls da história da indústria automotiva global. No Brasil, o número de carros atingidos também foi expressivo totalizando mais de 27 mil veículos.
O recall do automóvel defeituoso envolvido no acidente fatal teria ocorrido em 2015, mas o proprietário do carro teria ignorado o chamado. Não se tem notícias se o motorista sabia ou não que o carro em que estava dirigindo não havia passado pelo recall da Honda.
O Código de Defesa do Consumidor determina que o fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários (art. 10 § 1º do CDC).
Recall como dever de proteção do fornecedor
Vivemos em uma sociedade de consumo de massa e a possibilidade de erro em escala, apesar dos mecanismos cada vez mais eficientes de controle, é igualmente significativa. O problema não é o “erro” no processo produtivo, mas o que se faz a partir da constatação da ocorrência.
O fornecedor que realiza um recall está cumprindo o dever de transparência e boa-fé com a coletividade dos consumidores. Se é certo que não se deve condenar a empresa que realiza recall, tão pouco deve-se transferir ao consumidor a culpa pelo acidente de consumo, salvo se por ato consciente do perigo inerente a omissão.
Cabe ao fornecedor que introduziu o produto ou serviço no mercado a responsabilidade de indicar todas as providências adotadas e as medidas para a resolução do defeito e saneamento do risco. Em especial para bens de alto valor agregado e fiscalização como os automóveis.
O contingenciamento da quantidade de produtos ou serviços sujeitos ao defeito, inclusive os em estoque, e número de consumidores atingidos é requisito fundamental do procedimento de comunicação da nocividade ou periculosidade de produtos e serviços após sua colocação no mercado de consumo. Portanto, o recall só termina quando o último produto ou serviço defeituoso foi retirado do mercado ou consertado e não com o término na campanha no jornal ou revista.
Airbag mortal e a responsabilidade objetiva
No caso específico da primeira morte no Brasil causada pelo “airbag mortal”, a Honda responde objetivamente pelos danos causados à família da vítima, salvo se demonstrar culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. A obrigação do fornecedor quando ocorre risco ao consumidor é de sanar o problema, sendo responsável por toda a vida útil do produto que inseriu no mercado.
Em resposta ao questionamento inicial: o acidente de consumo por produto ou serviço defeituoso só exime o fornecedor, se este atendeu a todos os requisitos do plano de recall e se ficar demonstrada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Caso contrário, não podemos falar em culpa do consumidor por não ter atendido ao recall.